CambalachoNeila Baldi style="width: 25%; float: right;" data-filename="retriever">
Nos anos 1980, Silvio de Abreu escreveu uma novela que criticava o comportamento condescendente frente a falcatruas e corrupção. Segundo ele, Cambalacho falava da falta de vergonha geral no Brasil: o país era tão corrupto que as pessoas se sentiam no direito de serem corruptas. A trilha de abertura, de Walter Queiroz, dizia: É tudo banana Que país é este no qual vivemos? Um país em que morrem quatro mil pessoas por dia, de uma doença que já existe vacina, e a vida segue... Um país em que se aceita todo tipo de cambalacho, disfarçado de "bondade". No momento atual, o que deveria ser mais importante para governantes e legisladores? Frear a transmissão do vírus e estancar a mortandade do povo, com lockdown - e auxílio para tal - e vacinação em massa. 300 PICARETAS Pois foi para dar um jeito na vacinação em massa que a Câmara dos Deputados aprovou uma lei que altera a anterior, que permite a compra de vacinas pela iniciativa privada. De boas intenções o inferno está cheio. Agora, o empresariado pode comprar vacinas sem doar para o SUS. Na prática, permitiu a furada da fila: quem tem dinheiro, tem vacina. Foram 307 votos a favor - como na música do Paralamas do Sucesso, 300 picaretas. Se, teoricamente, o empresariado tiver acesso a vacinas, teremos uma fila paralela. Hipoteticamente, poderíamos ter pessoas sem risco vacinadas antes das que têm risco. Além da fila paralela, levanto outra questão: em um país em que empresários e empresárias compram clandestinamente vacinas - e, depois, descobre-se que eram falsas - quem garante que os trabalhadores e trabalhadoras serão imunizadas? Comprarão doses verdadeiras? Sendo verdadeiras, aplicarão em seus empregados e empregadas ou em suas famílias? MERCADO PARALELO O mercado paralelo gera insegurança sanitária. O texto permite, por exemplo, que sejam adquiridas vacinas que não tenham autorização ou registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Podemos ter vacinas falsas ou de segunda linha. Além disso, a disputa privada - imoral em crise sanitária - pode provocar aumento dos preços. Nosso empresariado patriota, que está tão interessado em comprar vacina para a classe trabalhadora - vocês acreditam nisso mesmo? - poderia comprar e distribuir máscaras PFF2 e ajudar a construir um grande lockdown nacional para frear o vírus. Mas o que importa é a vida deles, não a nossa.
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Teoria do Medalhão Noemy Bastos Aramburú style="width: 25%; float: right;" data-filename="retriever"> Os jovens costumam dizer que inventaram tudo. Temos que tirar o chapéu para o crescimento nas últimas décadas, saímos do telefone para o celular, do disquete para a nuvem. Porém, também temos que tirar o chapéu para Machado de Assis com a Teoria do Medalhão, pois tem sido figura presente nesse momento de pandemia. Para os esquecidos, vamos relembrar a Teoria do Medalhão - um pai no jantar de aniversário de 21 anos do filho, aconselha-o a tornar-se um Medalhão, alguém que tem riqueza e fama, passando a tecer uma teoria de como o filho deveria agir para tal intento. Primeiro, deveria mudar hábitos e costumes, anulando gostos e opiniões pessoais, sendo neutro perante qualquer tema, com vocabulário limitado, apresentando humor simples e direto, sem ironia. Falou ainda ao filho que ele deveria ser popular e chamar a atenção. O que o mundo pós-Covid tem nos mostrado é a circulação de medalhões na política, na economia, na saúde, e até nas redes sociais. E quem são os pais destes novos medalhões? Resposta complicada, porém, seus reflexos não deixam dúvidas. Um exemplo é o Enem. Dos 2.795.391 candidatos que realizaram a prova, apenas 28 conseguiram a nota máxima na redação. Embora alguns defendam o rigor da correção dessas redações, outros entendem que são justas, os candidatos realmente apresentam problemas para realizar um texto adequado. Estes observaram o que o pai determinou na Teoria, vocabulário limitado, sem posicionamento e opiniões firmes. E na política? Os medalhões também se fazem presentes, ficam preocupados com a sua imagem perante a população, deixando de tomar medidas realmente necessárias. E na economia? Talvez, aqui os Medalhões sejam os mais beneficiados. A caixa de luva descartável, que custava R$ 20 com a pandemia passou a custar R$ 200. Este observou o que o pai disse sobre riqueza. E na saúde? O depoimento de um empresário multimilionário curitibano, que desabafou para o seu Prefeito dizendo que, apesar de possuir dinheiro para comprar dois hospitais, não conseguia leito para hospitalizar sua mãe, demonstra Medalhões na saúde. E os que procuram chamar a atenção, ser popular e ter fama? Isto temos presenciado nas redes sociais, neste mar encontramos desde o Medalhão camarão até o Medalhão tubarão, que independente do seu tamanho apresentam estragos de mesma proporção. O interessante deste habitat é que, por ser virtual, sem o que chamamos de olho no olho, as atitudes tornam-se mais fáceis, pois perdem o freio inibitório que o contato físico dificulta, destarte com o simples "enter" pode destroem uma carreira, uma amizade, uma família e até mesmo uma vida. Que a pandemia arranque das famílias entes queridos não podemos evitar, mas que os Medalhões destruam sonhos podemos evitar, com relacionamentos verdadeiros, com riqueza de saúde e fama de bondade.
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